O Dossiê Fotografia Alagoana chega a sua 7ª edição com dois artistas bastante inventivos e estudiosos das Artes Visuais – Francisco Oiticica e Renata Voss. Ele, que é também artista plástico, professor e escritor, nasceu no Rio de Janeiro, mas mora em Maceió há bastante tempo. Ela, alagoana, também leciona fotografia na Universidade da Bahia. Com vasta bagagem cultural e acadêmica, ambos vêm desenvolvendo trabalhos artísticos densos e vanguardistas na temática visual.
Renata Voss
Alagoana de Maceió, Renata Voss mora atualmente em Salvador onde ensina e estuda fotografia. É professora na Escola de Belas Artes da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e mestre e doutoranda em Artes Visuais pela universidade. Começou a trabalhar profissionalmente em 2004, desenvolvendo tanto fotografias para publicidade quanto trabalhos artísticos autorais.
Segundo ela, é difícil precisar quando a fotografia entrou em sua vida. “É algo tão presente no nosso dia a dia. Somos fotografados, vemos fotografias o tempo todo”, diz ela. “A minha primeira lembrança da figura de um fotógrafo é do meu Tio Zequinha tirando um retrato meu. Em 1999 fiz o primeiro curso e a partir daí nunca mais parei”.
Graduou-se em Publicidade pelo antigo CEFET-AL (hoje IFAL), porém, desde muito antes o interesse pelo mundo visual já existia e encaminhava-lhe para esta prática profissional. “Depois passei a desenvolver projetos autorais e quis me aprofundar nas artes visuais. Daí fiz primeiro uma especialização no Senac e depois veio o Mestrado em Artes Visuais na UFBA entre 2011 e 2012, na linha de processos de criação artística, em que a pesquisa engloba o fazer artístico como parte da pesquisa”.
Em 2011, Renata realizou uma série de trabalhos relacionados a fotografia e memória que tiveram como local de estratégia o Cine Plaza, antigo cinema do bairro do Poço, em Maceió. Intitulado de “Instante Impreciso nº 3”, a ação envolvia a soltura de imagens de dentro do prédio onde funcionava o cinema.

“Anunciamos que o cinema iria exibir suas últimas imagens, sendo essas fotografias impressas em transparências amarradas a balões pretos. Como o cinema não tinha mais teto, as imagens saíam voando de dentro do cinema. É sobre um lugar que não exibe mais, mas imagens ainda gerar imagens”, explica.
“Este trabalho toca bastante na fotografia como um gatilho para a imaginação e lembrança daqueles que viveram alguma experiência naquele cinema”. Em 2013, Renata fez o Doutorado no mesmo programa, mas trabalhando a fotografia e o movimento, seja este relacionado aos aparatos de captura ou à memória.
“Entendo que essa formação acadêmica faz parte de um interesse pessoal. No entanto, acredito que o mestrado e doutorado foram essenciais para aprimorar a minha percepção sobre o que produzo e ampliar o meu entendimento sobre a fotografia na contemporaneidade. Penso também que na minha formação foram bem importantes cursos livres de diversas técnicas. Acredito que a fotografia não é somente técnica e que estas devem existir em função de determinado propósito”, afirma.
Seus interesses fotográficos incluem lugares, paisagens, caminhos, a passagem do tempo; além de suportes e processos alternativos em que a fotografia possa estruturar-se. Suas técnicas também são bem diversas, nas quais ela se utiliza tanto da captura digital, como também com filmes analógicos.
“Venho estudando também alguns processos químicos históricos que utilizo nos meus trabalhos: cianotipia, goma bicromatada, papel salgado, marrom van dyke, platina/paládio. São processos de cópia, mas que na maior parte das vezes parto de uma imagem digital para desenvolver o trabalho”, revela.
A experimentação também é fator presente em seus fotógrafos inspiradores, a exemplo de Thomas Farkas e Geraldo de Barros. “Gosto também do Cássio Vasconcellos e seu olhar voltado para a cidade; o Guilherme Maranhão é uma referência ao realizar trabalhos que interfere/cria aparatos para fotografar de uma maneira não prevista ou ao utilizar materiais fotográficos vencidos ou em desuso, como filmes e químicos. Também o Joan Fontcuberta ao provocar o pensamento sobre a fotografia como uma ficção que se apresenta como verdade”.
Já em 2015, surgiu a série “Alagoas Iate Clube”, que ficou em primeiro lugar no Salão de Fotografia do TRT, contendo uma série de fotografias que ela vem fazendo do clube ao longo do tempo.




“Neste trabalho, revelo a primeira imagem dele ainda com o letreiro no processo da goma bicromatada, revelação que permite cópias coloridas, da imagem viva daquele lugar. As demais cópias são em papel salgado – que remete ao mar, às piscinas com águas salgadas, à corrosão com o passar do tempo”. Na última, Renata não fixa a imagem e ela vem se apagando com o tempo, comparando a foto com a realidade do lugar e tantos outros que desaparecem no tecido urbano.
No díptico “Eris” (2015) e “Márcia” (2012), a fotógrafa trata da relação da perda de pessoas próximas, apresentando retratos de dois amigos que faleceram em 2015 e 2012, respectivamente. “O retrato se configura por uma relação de proximidade com os fotografados e se materializa através da revelação em anthotype, técnica que permite a revelação de fotografias diretamente em folhas ou utilizando o sumo de vegetais”.
Seus trabalhos também compuseram diversas exposições coletivas, além de 6 mostras individuais: “Ruir”, na Aliança Francesa, Salvador em 2017; “Perder de Vista”, na Galeria do ACBEU, Salvador, em 2016; “Passagem”, na Pinacoteca da UFAL, em 2015; “Estudo para perder de vista”, na Galeria Jenner Augusto, Aracaju, em 2014; “Brevidade”, na Galeria do SESC Aracaju, 2011; e “Lugares Comuns ou Vazios Encenados”, na Pinacoteca da UFAL, em 2008 e no Sesc Arapiraca em 2011.
Em 2017, ela também participou da Residência Artística da FAAP, em São Paulo, durante os meses de março a maio. “Em 2015 participei de outra residência artística promovida pelo LabClube, do Coletivo Filé de Peixe, no Rio de Janeiro que reuniu um artista de cada região do país para desenvolver um trabalho com processos artesanais, que foi publicado em julho de 2015 no livro Processos Fotográficos: ensaios para uma poética experimental”. O livro está disponível em: http://www.labclube.com/publicacoes.
Seu trabalho mais novo é “Ruir” (2017), no qual ela partiu de um relatório da Defesa Civil que listava vários imóveis com risco de desabamento na cidade de Salvador. “Esse relatório me levou a endereços, sendo que optei por fotografar aquelas casas com alto risco de desabar. As imagens foram reveladas por técnicas fotográficas também quase esquecidas e que não são muito utilizadas: papel salgado e platina/paládio”.
O trabalho é apresentado no formato de livro. “Pretendo durante este ano de 2018 investir na divulgação deste trabalho. Venho desenvolvendo também um livro artesanal com um grupo de artistas e designers que será todo revelado em cianotipia e estou também iniciando uma pesquisa com um grupo que envolve a fotografia revelada em objetos”.
Francisco Oiticica
Filho de alagoano, Francisco nasceu no Rio, mas sempre visitava Maceió nas festas de final de ano quando criança. Casou-se com uma alagoana e começou a dar aulas na Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde se formou em Pintura na Escola de Belas Artes. Após um tempo surgiu uma oportunidade de trabalhar na Ufal e veio para substituir nada menos que Celso Brandão nas aulas de fotografia da universidade.
“Esse fato foi decisivo para a entrada da fotografia na minha vida”, revela. “Nesse mesmo período, ela foi ganhando um espaço crescente no meio artístico como uma linguagem contemporânea, pelo fato de, entre outros fatores, ser uma mistura de vários campos de conhecimento. Então eu deixei a pintura meio de lado e investi na fotografia”.



Segundo ele, a fotografia e a comunicação apareceram para expandir os horizontes de sua percepção artística. “Isso me ajudou a sair da dicotomia entre abstrato/figurativo, e eu passei na verdade a explorar essas contradições e a discutir essa linguagem dentro do meio”.Mesmo assim, a formação em artes plásticas contaminou-o no exercício da fotografia.
“Gosto muito de fotografar o imprevisto, o ambíguo, o contraditório e o paradoxal. Isso me permite concentrar a pesquisa no olhar e na recepção, na fotografia como um fato social, mais do que em seu aspecto mecânico, convencional”.



A trucagem, pós-produção e a manipulação também são elementos que Francisco utiliza em seus trabalhos. “No equipamento eu gosto muito de trabalhar com tecnologias de baixo impacto, ou seja, câmeras sem muita sofisticação, mais baratas”, afirma. “Isso me permite incorporar o que não é evidente, explorando a nitidez como um acidente, não uma obrigação”.
Francisco Oiticica tem guardado vários ensaios inéditos. Dentre eles existe um chamado Bug. “São prints de downloads interrompidos de imagens do Instagram por falha de conexão com a internet”, comenta.
“É uma coisa que também gosto de fazer: sabotar, desrespeitar dispositivos. Buscar um resultado para o qual ele não estava preparado ou não foi programado”.
Outro trabalho baseado nessa linha é a exposição Real Alagoas, que ficou em cartaz no Museu Théo Brandão em 2014. A temática do trabalho é a problemática identidade urbana de Alagoas. “Utilizei o recurso de foto panorâmica do celular enquanto dirigia pela cidade, então fiz o programa trabalhar aleatoriamente resultando nessas imagens”, comenta.
Ele cita Celso Brandão como um de seus inspiradores. “Quando cheguei aqui nós viajamos muito pelo interior e ele me mostrou muito do que eu não conhecia sobre arte popular”, lembra. “Também aprecio muito o Juarez Cavalcanti pelo seu apuro. Internacionalmente tem muitos. Eu gostava muito de um fotógrafo francês Denis Roche, assim como o americano William Klein.”
Já expôs no Rio, na França, em Pernambuco e em Alagoas. Só em 2016, ele organizou quatro exposições. Para este ano, além de algumas mostras que estão por vir – a exemplo de uma em maio, no Bon Vin, dois trabalhos em publicação também sairão. “O catálogo da exposição que fiz no Cesmac chamada Monstruário – autorretratos disruptivos, que foi uma longa série de autorretratos manipulados em aplicativos de celular”.
E em Murmuro: ensaio sobre o imprevisto, Francisco fotografou o destino que se dá às coisas que não mais servem, encostadas nos muros da cidade. Esse ensaio foi contemplado pela Imprensa Oficial Graciliano Ramos e sairá numa publicação ainda em 2018. Para ele, o mercado para a fotografia é escasso, mas se expande. “A produção em Alagoas vai bem, e o mercado corre atrás dela.”
FOTO DE CAPA*: “Da série Alagoas”, de Renata Voss
Endereço Eletrônico
RENATA VOSS – Facebook –facebook.com/renatavoss | Instagram: @renatavoss |
Site: renatavoss.com
FRANCISCO OITICICA – Facebook –franciscoeliasrosa | Instagram: @francisoeliasrosa
Confira também:
1ª edição – A poesia das formas em preto e branco de Luísa Patury e Tony Admond
2ª edição – A simbiose fotográfica de Jorge Vieira e Thiago Sobral
3ª edição – João Facchinetti e Alberto Lima – Multiplicando a fotografia em Alagoas
4ª edição – João Dionísio e Cláudia Leite – experiências visuais antropológicas com perspectiva documental
5ª edição – As histórias visuais de Ricardo Lêdo e Ailton Cruz
6ª edição – Construindo caminhos fotográficos com Luna Gavazza e Andréa Guido
QUERIDa IRINEI, MUITO ME AGRADA POR SUA CAPACIDADE DE SABER COERENTEMENTE SEU TREBALHO UM SUPERANDO OUTRO .,. PERFEITO, SOBRE FOTOGRAFA————–VOSS-,É DE EXTREMO VALOR APESAR DE MEU CONHECIMENTO, NÃO SER TÃO CAPACITADO, NO ASSUNTO, AINDA TENHO A CAPACIDADE DE APRECIAR O PERFEITO, ESTUDADO., IMAGINADO E MAIS,,,,,É O CASO DE RENATA, FIQUEI ENCANTADA. GRANDIOSO.
NOSSO VALOROOSO PROFESSOR FRANCISCO OITICICA, TEM UM TEOR DE SER UM ALAGOANO , ARTISTICO, PENSANTE PARA CAPTAR SOBRETUDO O QUE ALAGOAS, TEM DE MAIS BELEZA………….QUANDO TUDO SE MODIFICAR, FICARÃO NOS MUSEUS O QUE JAMAIS VOLTARÁ………..EM FIM, IRINEIA, PARABENIZADA POR TODOS, PARABÉNS POR MAIS UM SUCESSO.