A segunda edição da série ArteUrbana.AL conta a trajetória de Ursa, que utiliza do grafite e da arte digital para externar suas inquietudes, além de contá-las como suporte para seus gritos de protesto. Ela conversou com o Aqui Acolá e contou um pouco sobre suas produções e filosofias dos artistas de rua.

Natural de Mato Grosso, mas habitando em terra maceioenses há cerca de 15 anos, o interesse pelo desenho e pelas tintas surgiu ainda criança na vida de Ursa. Seja copiando desenhos de Dragon Ball Z com lápis de cor ou pintando telas a óleo, a artista já exercitava seu traço lá pelos 12 anos de idade. Com a chegada da adolescência, o impulso de criar coisas foi se aflorando e, segundo ela, a partir daí até hoje ela vem buscando construir uma identidade artística. “Apesar do que algumas pessoas dizem que conseguem identificar o meu traço, acho que essa identidade ainda não está sólida”.
Ela despertou para a arte de rua em 2010, quando estava em uma pequena cidade do Espírito Santo chamada Anchieta e se viu rodeada de grafites. “Os daqui me chamavam a atenção, mas foi lá que eu tive esse ‘insight’ e voltei para Maceió louca para pintar”, revela. Só dois anos depois é que Ursa começou de fato a pintar na rua, quando conheceu os artistas Zagri e Simplez. “Desde então comecei a me envolver cada vez mais, tanto pela arte de rua em si quanto pela essência do grafite que é também um grito de protesto”.



Ao se aprofundar cada vez mais na arte urbana, Ursa percebeu que tinha encontrado seu lugar. Na rua seu trabalho poderia ser visto por muito mais gente do que num ambiente recluso de uma galeria. Passou a participar de encontros de grafite, tanto em Maceió quanto em cidades como Recife, Aracaju, Salvador, Curitiba. “Teve um encontro que me marcou muito – e ainda marca – chamado Cores Femininas, que é organizado pela ONG Cores do Amanhã, na comunidade do Totó em Recife”, diz ela. “Ao longo dessa jornada de encontros eu pude perceber que você não aprende o grafite num tutorial do Youtube. Você aprende na rua”.
Em consequência das pinturas que fazia nas ruas, os trabalhos comerciais começaram a surgir e Ursa passou a viver do grafite. Até que em 2016, em decorrência de uma tendinite, a artista teve que parar de produzir até se recuperar, o que vem acontecendo aos poucos com fisioterapia e musculação. Para ela, o simples fato de colocar sua arte na rua para que todos a vejam, independente de curadoria, já é um grito.
“Meu trabalho também tem outros tipos de protesto ligados ao feminismo. Fiz muito desse trabalho em Recife, aqui em Maceió não tanto por que tive que dar essa parada e estou voltando agora com uma pegada mais tribal”, comenta. Agora ela pretende mesclar o tribal com outro conceito que desperte algum incômodo na mente das pessoas, principalmente relacionado ao atual momento social.



Para seus trabalhos, Ursa gosta de utilizar apenas o spray. Apesar de ter pintado com stencil algumas vezes, não se identificou pelo fato de prender um pouco sua criatividade. “Já pintei muito com pincel também na rua, com látex e corante”. Suas pinturas englobam e variam em vários elementos como contrastes, degradês, realismos ou 2D. “Muitas vezes consegui juntar meu trabalho com o de outra pessoa e foi muito bacana a interação de dois desenhos dialogando”.
Por conta dos dois anos que passou sem pintar, somente alguns desenhos de Ursa ainda podem ser vistos pela cidade. “Há um paredão ao lado da Galeria Stella Maris ali na praia que fizemos em 2016, onde eu pintei um portão de madeira. Tinha uma caveira na Amélia Rosa que fez muito sucesso, o pessoal tirou muitas fotos lá. Na Cruz das Almas tem um dragão também, perto da praia.” Seus trabalhos também estão em algumas ONGs como a Pata Amada, Pata Voluntária, além do Quintal Cultural e do Projeto Erê. Mais recentemente, pintou alguns desenhos junto com o artista Tars pelo centro da cidade.

“Já ensinei algumas pessoas a grafitarem e o que sempre digo é que você tem que ir pra rua, não há como aprender de outra forma”, afirma. “Acho que também não é tão necessário saber desenhar, é colocar pra fora o que está dentro de você. Até porque o grafite como arte marginal não preza muito pela estética acadêmica”. Ela destaca também a abertura que a arte urbana proporciona para o artista.
“Acho que é uma das formas de expressão mais livres que existe no mundo. Não tem curadoria e todo mundo pode ver”.
De volta às ruas, Ursa agora está envolvida num projeto bastante ambicioso. “Estou dentro de uma ONG de mulheres fundada recentemente aqui em Maceió e que tem visibilidade LBT. Em meados de julho e agosto, você vai começar a notar uma atividade muito louca em Maceió”, prometeu. O projeto envolve grafite e posters lambe-lambes que gritarão contra o preconceito. “Minha intenção é voltar a pintar com todo o gás, fazendo tribal ou fazendo críticas sociais, e quem sabe lá na frente viver plenamente das criações. Seja de fine art, grafite ou digital”.

Instagram: @ursa____ e @ursa.store
Confira também:
1ª edição – Rafael Santos: Muralismo, Identidade cultural e histórica