José Paulo é um artista nato. De fala mansa, simples e profunda, sua sensibilidade pode ser retratada nas obras únicas e singulares que produz há pouco mais de 6 anos de atividade artística. A rudeza e a rigidez dos materiais que recolhe como matéria-prima se transformam em animais de uma fauna mágica e chamativa. O Aqui Acolá conversou com ele sobre sua vida, seu ofício e seu destino de dar vida aos seres que vivem em sua cabeça de artista.
Natural do município alagoano de Chã Preta, mais especificamente na Fazenda Bonito no dia 21 de dezembro de 1957, José Paulo foi ainda criança para a cidade de Viçosa e adolescente para a capital. Já na infância ele lembra as artimanhas que fazia para expressar e exteriorizar seu sentimento de artista. “Com 8 anos eu fazia pincéis com os pelos de rabo de cavalo que eu cortava junto com um graveto de madeira e saía pelas casas da cidade limpando e pintando as imagens dos santos. No interior o povo é muito devoto”, recorda. “Quando a pessoa nasce pra ser, vai ser. Não precisa de escola, a escola é a vida.”
Já em Maceió, começou a trabalhar de ajudante de marceneiro, o que desenvolveu seu ofício e aptidão para trabalhar com as peças de madeira. “Quando eu era criança, eu não brinquei. Estou brincando hoje, fazendo meus próprios carrinhos”, revela ele sorrindo. Da labuta na marcenaria logo veio o desejo de produzir suas próprias obras de arte. “Eu vi numa loja, no mercado, uma galinha feita de aço, aí fiquei gamado e comprei, mas achei cara. Aí, a partir dela, eu fui fazendo as minhas próprias”.
Da galinha (que desta vez é fato que veio primeiro que o ovo) primogênita para hoje já se vão mais de 500 peças. “Fiz um trabalho de marceneiro com um professor da Ufal, Siloé (Amorim), e conversando com ele mostrei minhas peças. Ele me disse que eu estava num buraco coberto, mas era um artista e tinha que me revelar”. Deste encontro, nasceu a sua primeira exposição na Casa do Patrimônio no IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) em 2016 com 92 de suas criações.
Intitulada de “Metalmorfose”, a mostra teve curadoria de Alice Barros e Robertson Dorta e marcou fortemente a chegada de José Paulo no âmbito das artes visuais de Alagoas. “Conheci a professora Socorrinho Lamenha que me ensinou muita coisa, eu não sabia quase nada de arte”, lembra. “Ela me disse que minhas peças são cinéticas, se mexem. Nós somos seres cinéticos, minhas peças são vivas”.
Dois anos depois, veio a “Metalmorfose II” simultaneamente nas cidades de Arapiraca, Teotônio Vilela e Palmeira dos Índios. “Na Galeria do Sesc de Arapiraca também foi muito legal. Fizemos até uma espécie de fazendo no lado de fora”. Já em 2019, seus animais tomaram ninho no Complexo Cultural do Teatro Deodoro, no Centro de Maceió através da exposição Arca Zoomórfica, sempre com a curadoria, montagem e expertise da dupla Alice e Robertson. “A exposição no Complexo do Teatro Deodoro foi um sucesso pra mim. Muitas crianças adoraram minhas obras, eu quase não acreditava no que estava vendo”, diz José Paulo. “O caminho quanto mais difícil, mais é a certeza da chegada. Não é fácil, mas com esperança, com abnegação, a gente chega em qualquer lugar”.









Após uma cirurgia para tratar de um problema no coração, José Paulo teve que abdicar do trabalho cotidiano com a marcenaria e hoje se dedica somente a produzir suas obras artísticas. “Só que ser artista em Alagoas é difícil. É alegre, mas é duro”, desabafa. “Gosto bastante quando tem exposição, muita gente vem tirar foto comigo, muitas crianças. Até autógrafo eu já dei. Eu fico muito feliz”. Desse período no hospital, aflorou-lhe os sentimentos espirituais e extracarnais.
“Eu sei que eu tenho um anjo comigo. Nunca estudei arte e faço obras que o pessoal se admira tanto. Como é que consigo explicar isso? Eu devo ter sido artista em outra vida”, reflete. “Eu vejo uma sombra ao meu lado quando estou trabalhando, fico arrepiado, me emociono”.
Seu processo de produção às vezes não sai do jeito que ele pensava inicialmente, mas a obra não deixa de tomar vida. “De vez em quando eu penso uma coisa: vou fazer um cavalo, mas aí no meio no trabalho eu vejo que não dá, mas ele consegue virar um leão ou um cachorro”. E a fonte de suas criações são inúmeros objetos difíceis de se pensar como matéria-prima para obras de arte. “Uso pneu, madeira, ferro, pedra, vários tipos de coisa”, diz ele. “Minha técnica é mista, porque misturo vários materiais diferentes numa obra só e aí fica legal”.
Segundo ele, a arte mudou sua vida. Teve papel de educação, de sensibilidade e agora de renda.
“Arte lhe educa, ela vem de dentro. Eu vejo as figuras e as imagens que eu quero fazer em todo lugar, tanto dentro de casa quanto nos lugares onde passo. Vejo nas árvores, nas paisagens e nos azulejos de casa”.
José Paulo já nasceu artista e a vida, mesmo com direções não tão propícias, encarregou-se de direcioná-lo ao seu destino de “metalmorfose”: sempre se reinventando, pensando no novo e na próxima peça.
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