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SOLAR, de Andréa Laís

Do centro do sistema solar de Andréa Laís irradia uma musicalidade natural e elegante. Ela é a própria estrela em nascimento, iluminando planetas-canções com o brilho da voz em seu disco de estreia, SOLAR, uma viagem de quase quarenta minutos em um universo leve, criativo e que emana felicidade: um debute promissor.

Com apenas 24 anos, Andréa mostra maturidade nas escolhas estéticas e principalmente nas interpretações coerentes e sem exageros. Dona de uma bela voz, ela tem a sensibilidade de se colocar a serviço das canções, uma característica que a destaca como intérprete. São dez faixas de compositores predominantemente alagoanos, que guardam elo entre si e revelam a proposta de um disco ensolarado e orgânico, pautado pela simplicidade. Esse clima pode ser sentido nos arranjos bem construídos e no entrosamento dos experientes músicos Toni Augusto (guitarras), Allysson Paz (bateria), Yuri Costa (teclados) e Fabinho Oliveira (baixo e direção musical): amigos que já se conhecem de trabalhos anteriores e que têm prazer evidente em tocarem juntos. Isso certamente ajudou a construir o clima harmonioso que transborda no disco.

Aqui Acolá - SOLAR, de Andréa Laís (2)
Foto: Divulgação

SOLAR abre as cortinas com “Ovo”, composição de Marcelo Marques e Gustavo Gomes, com o rufar da caixa de bateria, como se anunciasse o cortejo de canções prestes a vir. Andréa ergue a voz como estandarte, sem disfarçar o sotaque, exibindo orgulhosa os acentos de sua terra em letra que fala sobre as marcas do sol na pedra e no povo que sente sede. Destaque para as guitarras, fluídas, quase como a “água, que tem gosto por evaporar”.

A flecha”, primeira das cinco composições de Júnior Almeida no disco, é uma bela declaração de intenções da cantora: atingir o coração do público com o seu cantar, com sua música. De ambientação Rock, com andamentos inteligentes de bateria, timbres distorcidos e solo de guitarra com dissonâncias, é um dos grandes momentos do disco.

Não se pode negar que a contribuição de Almeida é imensa. Não bastasse ter servido como um tipo de guru musical do álbum, ainda entregou quatro canções inéditas, do tipo “Lado A”, para SOLAR. Além de “A flecha”, ele assina duas com o poeta Fernando Fiúza: “Só não gosto de maltrato”, que tem balanço Reggae, sonoridade serena e letra bem humorada; e o Funk “Sol lá fora”, que foi composta durante as gravações do disco e conta com participação especial de Júnior num descontraído duo com Andréa.  Em parceria com a gaúcha Gisele De Santi, o cantor compôs “Era tarde”, um Carimbó moderno de riffroqueiro e sonoridade levemente psicodélica: outro feixe de luz de SOLAR. Encerrando a lista de colaborações de Júnior, Andréa dá nova roupagem a “Verde”, que já havia sido lançada pelo cantor em 1999. Mais solta, em arranjo com direito a guitalele (instrumento da família do ukelele), a nova versão aparece como um pôr de sol em uma lagoa.

Aqui Acolá - SOLAR, de Andréa Laís (2)
Foto: Divulgação

Essa pitada de melancolia dos finais de tarde coloridos pelos tons avermelhados dos raios solares também pode ser percebida em “A voz do coração”, dos cariocas Ronaldo Bastos e Celso Fonseca, com destaque para os arranjos de teclado e a participação especial da violoncelista Miran Abs. Na delicada “Bem me quero”, do parceiro musical de longa data Deyves e de Alana Barros, Andréa mostra todo o poder emotivo de sua voz, acompanhada apenas pelo piano, numa interpretação irretocável.

Eu sempre avisei”, do baiano Luisão Pereira, é mais um gol de letra, carregando também um pouco do desalento das melhores baladas românticas sobre amores desfeitos. Na contemplativa com ares de Afoxé “Tarde de sol”, de Gabriel Cerqueira, da banda Projeto Sonho, Andréa leva o ouvinte a um passeio por paisagens corporais, de céus de baunilha, mares e espaços em brasa: uma viagem interessante pelo universo de SOLAR.

Aqui Acolá - SOLAR, de Andréa Laís (1)
Foto: Divulgação

A própria Andréa revela que esse trabalho é resultado de suas experiências artísticas nos últimos anos, reunindo uma gama de influências que proporcionam um diálogo da MPB com diversos ritmos, como o Rock, o Maracatu e o Coco. Múltiplo, mas com uma unidade bem definida, SOLAR representa bem Andréa, apostando numa abordagem refinada de seu repertório, o que combina com sua voz e postura como artista. Nesse ponto, a direção de Fabinho Oliveira merece menção especial. O músico soube definir um conceito e guiar seus parceiros musicais em performances concisas e inspiradas, extraiu deles o melhor, fez com que cada um imprimisse personalidade tanto nas interpretações vocais de Andréa quanto em arranjos instrumentais simples, privilegiando a pausa, tão “engolida” no atual cenário musical dominado pelo estardalhaço do pop.

Na contramão, mas no sentido certo, Andréa escolheu a calma de um processo de imersão no estúdio MPG, em Maceió, em dias inteiros de sessões de gravação, com tempo para pensar e discutir cada nota musical, com espaço para estabelecer uma convivência focada e descontraída com todos os envolvidos nesse projeto. Saiu de lá com um disco sem arestas, “redondo” como o sol, iluminado. 

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